David Vinicius do Nascimento Maranhão
A tributação dos incentivos fiscais de ICMS na base do IRPJ e da CSLL é um dos temas mais sensíveis do direito tributário atual. Empresas em todo o país convivem com a insegurança sobre como registrar esses valores e quais os limites para sua exclusão da tributação federal. A discussão ganhou ainda mais relevância após a edição da Lei nº 14.789/2023, que buscou ampliar a incidência sobre benefícios estaduais, reacendendo uma disputa histórica entre União, contribuintes e tribunais.
O debate não é apenas jurídico. Ele toca diretamente na estratégia financeira das empresas, pois pode significar a diferença entre a manutenção da competitividade ou a elevação da carga tributária a patamares insustentáveis.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já firmou posição de que os créditos presumidos de ICMS não podem compor a base do IRPJ e da CSLL. O argumento central é que a União não pode tributar aquilo que os Estados concedem como incentivo, sob pena de violação ao pacto federativo. Essa proteção decorre de precedentes como o EREsp nº 1.517.492/PR, que reconheceu a natureza de renúncia fiscal estadual desses créditos, afastando sua qualificação como receita tributável.
Por outro lado, benefícios como isenção, diferimento ou redução de base de cálculo foram tratados de forma distinta no julgamento do Tema 1.182. Nesses casos, a exclusão da tributação federal depende do cumprimento de requisitos legais, como a destinação do valor à constituição de reserva de lucros e sua utilização para absorção de prejuízos fiscais ou aumento de capital social.
Essa diferenciação abre espaço para inúmeras interpretações, especialmente por parte da Receita Federal e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), que em decisões recentes têm imposto exigências adicionais não previstas em lei, acirrando a insegurança jurídica.
Grande parte da polêmica gira em torno do conceito de subvenções para investimento. Previstas originalmente no Decreto-Lei 1.598/1977 e depois na Lei nº 12.973/2014, essas subvenções representam incentivos concedidos como condição para implantação ou expansão de empreendimentos econômicos. Diferem das subvenções para custeio, que se destinam apenas a reduzir custos operacionais sem exigência de contrapartida em investimento.
Para o contribuinte, essa distinção é fundamental. Apenas as subvenções para investimento, devidamente contabilizadas em reserva de lucros e sem distribuição aos sócios, poderiam ser excluídas da base do IRPJ e da CSLL. A Lei Complementar nº 160/2017 reforçou esse entendimento ao equiparar os benefícios de ICMS a subvenções de investimento, eliminando a necessidade de comprovar a intenção do Estado em estimular um novo empreendimento.
Apesar disso, a Receita Federal manteve postura restritiva. Seus atos normativos insistem em limitar a exclusão a valores efetivamente investidos, desconsiderando a amplitude reconhecida pela jurisprudência do STJ. Essa interpretação leva a autuações fiscais milionárias e mantém a disputa aberta.
Com a publicação da Lei nº 14.789/2023, a União mudou o regime e passou a tributar todas as subvenções como receitas, oferecendo em contrapartida um crédito fiscal limitado. Na prática, essa mudança reduziu a efetividade dos incentivos estaduais e gerou ainda mais incerteza.
Embora a lei tenha revogado o artigo 30 da Lei nº 12.973/2014, o STJ, em decisão recente (REsp 2.202.266/RS), reafirmou que os créditos presumidos permanecem excluídos da tributação federal, mesmo após a nova norma. A Corte destacou que a proteção decorre da Constituição e do pacto federativo, não podendo ser alterada por lei ordinária.
No entanto, para as demais subvenções, como reduções de base de cálculo ou isenções, a situação é menos clara. O cumprimento dos requisitos legais permanece essencial, e a divergência entre tribunais e órgãos administrativos continua a gerar instabilidade para os contribuintes.
O cerne do problema está na insegurança jurídica. Empresas precisam decidir como registrar seus incentivos fiscais e como planejar seus tributos, sabendo que há risco de autuação mesmo quando seguem entendimentos já consolidados no Judiciário. Esse cenário afeta diretamente a previsibilidade financeira, compromete investimentos e pode gerar litígios prolongados com a Receita Federal.
Mais do que um embate entre Fisco e contribuintes, trata-se de definir até que ponto a União pode limitar os efeitos de benefícios concedidos pelos Estados. Em última análise, o desfecho da questão impactará a lógica de atração de investimentos regionais, a geração de empregos e a competitividade da economia brasileira como um todo.
O tratamento tributário dos benefícios fiscais de ICMS, especialmente no que se refere às subvenções, representa hoje um dos pontos mais críticos da agenda tributária nacional. Se, por um lado, os créditos presumidos já contam com sólida jurisprudência favorável, os demais incentivos ainda caminham em terreno incerto, sujeito a exigências formais e interpretações divergentes.
Para as empresas, a mensagem é clara: acompanhar de perto os desdobramentos no STJ, STF e Carf é essencial para tomar decisões estratégicas seguras. Afinal, o resultado desse debate não afeta apenas o balanço tributário, mas a própria capacidade de investimento e crescimento em um mercado cada vez mais competitivo.
Em caso de dúvidas, envie um e-mail para nascimentopeixotoadvogados@gmail.com, fale pelo nosso site ou contato telefônico e WhatsApp (61) 99266-4446.
Publicado em: 2025-10-01
Última modificação: 2025-10-01