David Vinicius do Nascimento Maranhão
Imagine a seguinte situação: você chega pontualmente para o embarque, cumpre todas as exigências da companhia aérea e finalmente entra na aeronave, pronto para seguir viagem. O avião está lotado e, de repente, a tripulação anuncia que alguns passageiros precisarão ceder seus assentos. Ninguém se oferece voluntariamente e, então, a empresa decide “sortear” alguém para ser retirado do voo. Em seguida, você vê um passageiro sendo forçado a sair da aeronave, em meio a protestos e constrangimento coletivo.
Essa cena parece absurda, mas foi exatamente o que ocorreu nos Estados Unidos, em um voo da United Airlines, no trajeto entre Chicago e Louisville. O caso ficou famoso mundialmente quando o passageiro David Dao foi arrastado por seguranças, em 2017, após se recusar a ceder o lugar que havia comprado de forma legítima.
Apesar de ter acontecido em outro país, esse episódio serve como alerta para os consumidores brasileiros. Embora as regras da aviação civil no Brasil sejam diferentes, situações semelhantes podem ocorrer, e é fundamental saber que nenhum passageiro pode ser forçado a deixar o voo para dar lugar a outra pessoa, salvo em casos específicos previstos em lei. Quando isso acontece, o consumidor tem direito a indenização e a reparação integral pelos danos sofridos.
Além dos episódios notórios no exterior, existem relatos de situações semelhantes no Brasil e na América do Sul, envolvendo até mesmo a retirada de passageiros para acomodar times de futebol, delegações esportivas ou pessoas influentes. Há casos noticiados em que passageiros comuns foram retirados de voos já embarcados sob o argumento de que era necessário abrir espaço para jogadores ou autoridades.
Esse tipo de conduta, além de imoral, configura abuso de direito e pode gerar indenizações expressivas. Quando a empresa aérea privilegia determinados grupos em detrimento dos consumidores que pagaram regularmente por suas passagens, ela viola o princípio da isonomia e desrespeita frontalmente os direitos do consumidor. Em casos como esse, é essencial reunir provas, como vídeos, fotos e testemunhas, para embasar a ação judicial.
No Brasil, a Resolução nº 400/2016 da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) define as regras aplicáveis aos voos nacionais e internacionais que tenham origem, destino ou conexão em território brasileiro. Essa norma trata de situações como preterição de embarque, overbooking e cancelamentos.
O overbooking ocorre quando a empresa aérea vende mais passagens do que a capacidade da aeronave. Essa prática é realizada sob a expectativa de que alguns passageiros não compareçam ao voo, mas, quando todos aparecem, surgem os problemas. Nesse cenário, a companhia deve, primeiramente, buscar voluntários dispostos a viajar em outro horário, oferecendo compensações que podem incluir créditos em viagens, upgrades de classe ou até valores em dinheiro. É fundamental que esse acordo seja firmado de forma voluntária, com assinatura de recibo que comprove que o passageiro aceitou por livre vontade.
Caso ninguém aceite a proposta, a empresa pode selecionar passageiros para serem remanejados, mas, mesmo assim, deve garantir alternativas como reacomodação em outro voo, reembolso integral ou até a execução do serviço por outro meio de transporte. Além disso, a companhia é obrigada a oferecer assistência material, como alimentação, hospedagem e transporte, sempre que necessário.
Ao contrário do que aconteceu no caso da United Airlines, no Brasil a retirada forçada de passageiros dentro da aeronave é proibida. A ANAC já esclareceu que o auxílio da força policial só pode ser solicitado quando há risco à segurança do voo ou em situações de indisciplina e tumulto. O simples fato de não haver assento disponível não autoriza o uso da força.
O Código Brasileiro de Aeronáutica, em seu artigo 168, reforça essa proteção ao afirmar que o comandante só pode desembarcar alguém que coloque em risco a segurança das pessoas ou da aeronave. Isso significa que obrigar um passageiro a deixar o avião por causa de overbooking ou para acomodar pessoas privilegiadas é ilegal e caracteriza falha grave na prestação de serviço.
Portanto, ceder assento deve ser sempre uma escolha do passageiro, jamais uma imposição feita sob coação ou constrangimento. Quando há abuso, o consumidor tem respaldo legal para exigir reparação.
A retirada forçada é uma das mais graves formas de violação, mas não é a única que pode levar a um pedido de reparação. Problemas frequentes no transporte aéreo também geram responsabilidade da empresa.
Um exemplo comum são os atrasos e cancelamentos de voos. A ANAC determina que, nesses casos, a companhia deve oferecer alternativas de reacomodação, reembolso e, dependendo do tempo de espera, fornecer alimentação, hospedagem e transporte. Quando o atraso ultrapassa quatro horas ou o cancelamento ocorre sem justificativa e com pouco tempo de antecedência, os tribunais têm reconhecido o direito a indenizações, especialmente se houver prejuízo comprovado.
Outro problema recorrente é o extravio ou dano à bagagem. Quando as malas não chegam ao destino ou chegam avariadas, a empresa deve indenizar o passageiro por todas as despesas e transtornos causados. Se, além disso, o consumidor sofre tratamento desrespeitoso ou humilhante por parte dos funcionários, os tribunais entendem que houve dano moral, aumentando o valor da indenização.
Ainda é possível citar situações em que a empresa nega o embarque sem motivo justo, alega “superlotação” de forma infundada ou deixa de oferecer a assistência material obrigatória. Em todas essas hipóteses, a falha na prestação de serviço abre caminho para uma reclamação administrativa e, se necessário, para uma ação judicial.
Se você já passou por algum desses problemas, principalmente por ter sido obrigado a ceder seu lugar ou impedido de embarcar, é fundamental agir rapidamente. Guarde todos os comprovantes, como cartões de embarque, recibos, comunicações da companhia e registros de gastos com alimentação e hospedagem. Caso possível, registre vídeos ou fotos que demonstrem a situação e anote contatos de testemunhas.
Essas provas são fundamentais para garantir uma indenização justa e aumentar as chances de êxito na Justiça. Também é importante buscar orientação jurídica especializada, pois o advogado saberá avaliar a melhor estratégia, calcular os valores a serem pleiteados e assegurar que a empresa aérea cumpra todas as suas obrigações legais.
Lembre-se de que a compensação oferecida pela ANAC, muitas vezes paga em forma de voucher ou depósito, não impede que você entre com uma ação judicial. Essa compensação mínima serve apenas como reparação imediata, mas não cobre todos os prejuízos que você possa ter sofrido.
Empresas aéreas devem agir com respeito e transparência. Quando vendem mais passagens do que assentos disponíveis, quando alteram voos sem aviso prévio ou retiram passageiros para favorecer pessoas privilegiadas, elas estão descumprindo a lei e devem ser responsabilizadas.
Você não precisa aceitar calado. Conhecer seus direitos e agir com rapidez pode garantir não apenas a reparação financeira, mas também contribuir para que práticas abusivas deixem de ocorrer.
Se você ou alguém que conhece foi obrigado a ceder lugar, sofreu retirada forçada, enfrentou atrasos ou cancelamentos sem a devida assistência, procure ajuda jurídica especializada. Assim, você aumenta suas chances de obter justiça e evita que esse tipo de abuso continue acontecendo.
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Publicado em: 2025-09-25
Última modificação: 2025-09-25